Ao iG, governador do Ceará endossa Aécio no comando do Senado e diz que presidenta eleita deve reduzir dependência quanto ao PMDB
Cid Gomes (PSB), governador do Ceará, apoiou a eleição de Dilma Rousseff à Presidência da República. Porém, no começo de novembro, ele lançou o nome de Aécio Neves, do PSDB, para a Presidência do Senado. Em entrevista ao iG no Palácio Iracema, sede do governo cearense, Cid disse que sua escolha é uma questão de lógica: diminuiria a dependência do PMDB e daria melhores condições para Dilma governar. “Eu jamais ficaria na mão do PMDB”, afirma.Ele argumenta que os dois primeiros anos serão os mais difíceis para a petista porque ela terá de fazer ajustes. “Serão os anos de sacrifício”, explica. A consequência desse argumento é que Dilma precisará ter uma relação melhor com o Congresso do que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem tendo nos seus últimos anos de governo. Isso significa que ela precisará atrair a oposição com medidas práticas e o que pode ser oferecido, neste momento, é o comando do Senado. Esses argumentos, somados à capacidade de diálogo de Aécio, fazem do tucano o melhor nome para presidir o Senado no primeiro biênio da nova presidenta, afirma Cid.
Na entrevista abaixo, que faz parte de um conjunto de conversas que o iG planeja ter com governadores, Cid também comenta o preconceito contra nordestinos. Afirma que há lugares de São Paulo piores do que o sertão, diz o que espera que Dilma faça pelo seu Estado e explica as diferenças entre as quadrilhas que estão ganhando força no Nordeste e as facções criminosas de outras regiões do País.
iG - O senhor é um dos nomes do governismo que dialoga com a oposição. Os recentes problemas com o PSDB do Ceará atrapalham esse diálogo nacional?
Cid Gomes - Com os prefeitos, não faço discriminação, são programas para todos. Já sobre a política, ela não é estanque. Eu e Tasso Jereissati (senador pelo PSDB do Ceará) tivemos uma longa relação, fomos do mesmo partido durante muitos anos. O próprio PSDB fez parte do meu governo até seis meses antes da eleição. Eu tentei manter a composição com o PT, PMDB e alguns outros partidos, limitando essa composição à indicação de governador, vice e um senador. Esse era o meu desejo, deixando a indicação do outro senador vago. Eu votaria no Tasso para a outra vaga de senador. Infelizmente, isso não foi possível. Ele lançou um candidato ao governo e eu nunca mais falei com ele.
O senhor considera a relação com o PSDB rompida?
Tenho muitos amigos no PSDB nacional e estadual. Mas como vai ser no futuro? Não sei. O PSDB radicalizou muito na campanha contra mim.
Um desses amigos é Aécio Neves? Recentemente, o senhor defendeu o nome dele à Presidência do Senado.
As pessoas estão procurando chifre em cabeça de cavalo. Eu sugeri o que eu faria se estivesse no lugar da Dilma. O melhor conselho que eu posso dar a alguém é me colocar no lugar da pessoa e ver o que eu faria. O PMDB é um partido forte, com a maior bancada no Senado e a segunda maior na Câmara. A gente também sabe que o PMDB é um partido que pressiona pelos seus interesses e briga por eles. Eu jamais ficaria na mão do PMDB. Eu gostaria, lutaria para ter o apoio do PMDB, mas faria tudo que estivesse ao meu alcance para não ficar na dependência exclusiva do PMDB. Como você faz isso? Buscando diálogo com o PSDB, que tenderia a atrair o DEM também. Não precisaria nem cooptar.
Mesmo depois da troca de ataques da campanha eleitoral?
Claro que eu sei que, no âmbito nacional, essa coisa é muito forte, muito por conta da política de São Paulo. Mas mesmo em São Paulo, que é a base desse problema, agora tem o Geraldo Alckmin. Ele é uma pessoa de diálogo, diferente do José Serra, que é uma pessoa ranzinza. Ele também vai ter a responsabilidade de governar, e os Estados têm uma relação de dependência em relação ao governo federal. Aí eu chego no Aécio. Ele sempre teve um perfil de diálogo. Você pode ser oposição sem ser inimigo, sem ser doente, como é o Serra. Você está na oposição, mas pode dialogar. Tem coisas que são de interesse nacional
A capacidade de diálogo é o único alicerce do argumento do senhor?
A Dilma não tem a força popular que o Lula tem. Ela vai depender muito mais das instâncias representativas, do Parlamento, do Congresso, do que o Lula. O Lula, num determinado momento, poderia se opor às decisões do Parlamento. A Dilma tem o apoio do Lula, que vai estar solidário, mas ela não é o Lula. Quanto melhor o ambiente institucional da política, melhor para a Dilma. E isso se faz estendendo a mão para o outro lado. Os partidos vão dar o apoio de graça? Não é razoável. O Aécio é um nome respeitável. Em troca, o PSDB não precisaria aderir ao governo. Você poderia fazer uma lista de 10 pontos para o Brasil, 20 pontos. Quais são os pontos consensuais para o Brasil? Pronto, isso é factível. Sucessão é só para 2014. Seriam dois anos de paz, e justamente os dois anos que serão os piores anos dela. São os anos em que você tem de fazer os alicerces. Por melhor que esteja a situação do Brasil, serão dois anos de sacrifício.
Mas muita gente viu nessa declaração um movimento para 2014.
Isso é um negócio absurdo. Muita gente me viu cortejando o Aécio, para ele vir para o PSB. O Aécio não vai sair do PSDB, ele é a liderança emergente do PSDB, um partido muito maior do que o meu. Agora é a oportunidade dele e ele vai sair do partido? Isso não tem lógica. Ele vai vir fazer o que no PSB? O PSB é o partido dirigido pelo Eduardo Campos, nós também já estamos lá faz um bom tempo. O Aécio vai ser o terceiro do partido? Não tem a menor lógica.
A união do PMDB com outros partidos, com o objetivo de comandar a Câmara no lugar do PT,, reforçou a sua convicção?
Parecia que eu estava adivinhando.
Caso exista uma mudança na legislação, abrindo a possibilidade de deputados e senadores mudarem de partido, quanto o PSB pode crescer?
O melhor caminho de crescimento é o das urnas mesmo. A consequência natural, com mais governadores, é ter mais deputados, mas nas urnas, na votação. Aqui a gente dobrou o número de deputados do PSB. Crescemos no País todo. Em São Paulo, muito por causa da votação do Gabriel Chalita.
O que o senhor acha do Chalita?
Ele é um quadro ainda se formando na política. Tem futuro. Tive uma boa impressão dele.
Ele pode ser ministro da Educação?
Não entro na seara dos ministros. Aqui eu sou outro lado do balcão. Aqui eu estou nomeando e não faço com os outros o que não quero que façam comigo.
E o seu irmão, o deputado Ciro Gomes?
Estive recentemente com ele. Está concluindo o mandato. E é mentira que eu estou pedindo um lugar para ele no governo, quero deixar bem claro. O pessoal inventa muito. Quando não tem assunto, a imprensa inventa. Falo por experiência própria, por causa da formação do meu próprio governo aqui no Ceará.
O que o senhor espera do governo da presidenta Dilma Rousseff, em termos de benefícios para o Estado?
A Dilma é muito sensível às desigualdades sociais e regionais. O Nordeste e o Ceará são algumas das regiões com mais miséria e pobreza. Nós vamos ser beneficiados pelas políticas dela. Não tem jeito, é isso mesmo. O Nordeste tem, em relação ao Brasil, grandes desafios. A indústria siderúrgica, que é quem faz as chapas de aço para os carros, está toda no Sudeste. A planta siderúrgica está toda no Sudeste. Se você é uma montadora, você vai se instalar onde? Onde está perto da siderúrgica. Foi isso que fez com que o Sudeste se desenvolvesse. Esse é um erro estratégico, de falta de visão do País, da época de instalar a indústria de base no Brasil. O Sudeste e o Sul já tinham a riqueza de agricultura. Isso você não transfere, você não traz solo e clima para esta região. Se tivesse um estadista que pensasse o Brasil como um todo, colocaria a indústria aqui, que você pode colocar onde quiser. A riqueza do Brasil ficou toda concentrada lá.
Quais são as consequências políticas e sociais dessa concentração?
Não podemos ter dois Brasis. Algumas pessoas imaginam que podem construir um paraíso, só que a gente não tem fronteira. De vez em quando surgem essas idéias, de escolher um lugar no interior de São Paulo para criar um paraíso. Não tem conversa, invadem, vão outras pessoas atrás. Nós não temos fronteiras, não dá para barrar. Aliás, tem gente que gostaria de fazer isso, de pedir passaporte, de mandar nordestino de volta. Isso não é correto em nenhum sentido, nem pensando como brasileiro nem como ser humano. Isso é absurdo, não é humano. Não vale a pena nem comentar, não polemizo com isso.
O senhor se refere às reações contra o Nordeste por conta da eleição da Dilma?
Isso é conversa fiada. Não é verdade que a Dilma ganhou por causa do Nordeste. Existe um ranço contra o Nordeste, mas é minoria da minoria, é insignificante, e provavelmente esse sentimento contra o Nordeste não foi a motivação de todos os eleitores do José Serra, esse sentimento contra pobres, contra nordestinos. Foi de uma parte, é verdade, mas não a maioria. Esse público é insignificante. O brasileiro médio tem outra cabeça, é aberto. Quem faz esse discurso preconceituoso é uma minoria barulhenta. Quem tem coragem de escrever, de se expor, de pedir para matar um nordestino afogado, isso obviamente provoca uma reação. Mas isso é minoritário, é uma minoria desprezível. Pobreza e miséria tem em todo lugar do Brasil. Há lugares em que tem mais. A periferia de São Paulo pode ser pior do que o sertão.
No começo de novembro, uma quadrilha explodiu um banco no interior do Ceará. Em que essas quadrilhas são diferentes das facções de outros Estados do País?
Aqui o crime é interestadual, é mais do que uma facção criminosa local. São quadrilhas que circulam na Paraíba, Pernambuco, Piauí, Maranhão. Eles se movimentam de acordo com a intensidade da repressão. Começou a ter muita coisa aqui no Ceará. Identificamos as áreas e fomos para cima, especialmente no interior. Durante o trabalho de inteligência, descobrimos que as quadrilhas se movimentam pelos Estados todos.
Eles são do Nordeste ou vêm de outras regiões?
Pelas informações que tenho, esses grupos não têm ligação com Rio e São Paulo. São grupos nordestinos. Pode ter um ou outro, claro, mas não é o coração do negócio. São vários grupos promovendo ações em vários Estados, passando de um Estado para o outro. São quadrilhas formadas por gente de vários Estados, com informantes em vários locais, e muito bem articuladas. Essas quadrilhas, diferente da facção de São Paulo, não têm um comando único. São quatro ou cinco grupos, que agem sempre do mesmo jeito. Um mais com dinamite, por exemplo, o que é uma coisa maluca porque eles dinamitam tudo, inclusive o dinheiro. Outros grupos fazem sequestro, pegam o gerente do banco, o parente do gerente do banco. Eu defendo que tem de ter um plano nacional de segurança. O Brasil às vezes tem o lobby corporativo, aumentar o salário dos policiais. Claro que isso é importante, mas não é só isso. O que tem de fazer é esse plano e ter algumas iniciativas da União. De quem é a responsabilidade de impedir a importação de droga? Essa é função da Polícia Federal. Ela pega? Pega, mas está aquém do que deveria fazer. Além disso, não deveria ser só na fronteira, mas na cadeia toda, pegando até o pequeno.
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